Full album traz o que há de melhor na mistura de EDM com K-pop e a essência de que boygroups devem ser espalhafatosos
(K.O. Entertainment/Divulgação)
Devo admitir que, durante muito tempo, o ATEEZ foi um grupo que nunca prestei muita atenção. A superficialidade com que conhecia suas músicas e talentos era tamanha, que influenciou na minha percepção do que eles poderiam fazer no K-pop para me surpreender. E não é que eu estava errado? O ATEEZ, no comeback THE WORLD EP.FIN: WILL, está surpreendentemente maduro e perturbadoramente excêntrico — algo que todo boygroup deveria ser em algum momento.
Encabeçado pela title track Crazy Form, o álbum foi uma porta de entrada para eu entender melhor como a discografia do ATEEZ funciona e qual é o som deles. O EDM prevalece, misturado à experimentação do grupo com outros gêneros, e é tudo muito espalhafatoso; os cantores não se contentam em ficar apenas num único quadrado musical. E não é que foi exatamente tal arte, deveras estapafúrdia, que me conquistou ao K-pop no auge da 3rd gen há anos?
Com o ATEEZ em THE WORLD EP.FIN: WILL, naveguei em águas desconhecidas e imergi na companhia dos apelidados "piratas do K-pop", e a experiência foi curiosa e cheia de momentos positivos. Talvez eu devesse ter prestado a devida atenção ao boygroup mais cedo.
O ATEEZ, com THE WORLD EP.FIN: WILL, nos leva a uma viagem sonora envolvente
O comeback do ATEEZ inicia com WE KNOW, faixa que convida o ouvinte a uma experiência agressiva e que nos deixa sem fôlego. A música é sonicamente rápida, e o grupo canta sobre correr atrás de nós para sabermos que não escaparemos do ATEEZ — when you see my face, you better run, hide and seek. E Emergency, canção que vem em seguida, segue a linha da antecessora ao apresentar o boygroup como artistas que não vão te dar músicas que sejam bright, shiny ou qualquer coisa que seja apenas "fofinho"; o ATEEZ não faz isso.
A evidência dessa ideia é maior em Crazy Form, faixa que, para mim, é o puro suco do que gosto de chamar de "o uncanny valley do K-pop": a linha tênue entre adorar uma canção e achar ela a coisa mais estranha que já ouviu na vida.
Crazy Form é muito singular à maioria dos lançamentos de boygroups do ano. Antes, o ATEEZ já havia conquistado meu olhar com a eletrizante, barulhenta e incrível BOUNCY (K-HOT CHILLI PEPPERS), mas com Crazy Form eles foram um pouco além — a ponto de sentir uma veia saltar do meu pescoço quando tentei discernir minha opinião em relação à title track. O eletrônico sintonizado pelo autotune e influenciado por elementos do afrobeat é, ao mesmo tempo, soturno e frenético, e no fim das contas simplesmente perfeito. O MV, aliás, é indescritível de bom e com uma montagem que salta aos olhos.
Para mim, boygroups precisam surpreender. Enquanto avançamos para uma geração no K-pop que, em sua maioria, é moldada por projetos que mais parecem picolés de chuchu, o ATEEZ atua com ousadia numa title que causa estranheza e vontade de dançar, tudo junto e misturado. Não importa onde é o clímax, se o refrão é chiclete (contudo, pode apostar que é) ou se algum trecho da coreografia foi feito para ser trend no TikTok; o que importa é que o ATEEZ tem atitude.
Sinto que a música ARRIBA, que aparece logo depois na tracklist, quebra um pouco a excentricidade com classe que a title track esbanja anteriormente — exagerada até demais. Porém, Silver Light retoma a empolgante degustação de ouvir o ATEEZ em THE WORLD EP.FIN: WILL, nesse momento com um synthpop mais modesto, só que ainda assim maravilhoso de escutar.
As músicas solo ou em units do ATEEZ intensificam a força do comeback
Depois de Dreamy Day, uma música um pouco mais upbeat que lembra projetos de outros contemporâneos do ATEEZ — e que é uma das minhas preferidas do disco —, começam as canções do boygroup divididas em units ou solos. A primeira é MATZ, de Hongjoong e Seonghwa, que é dark e claramente influenciada pelo industrial techno e o trap. Além disso, foi impossível não associar o instrumental à salpicadas de algo meio Nine Inch Nails-ish que eu, particularmente, amo e devoro sempre que tenho a chance.
E o comeback do ATEEZ segue em THE WORLD EP.FIN: WILL com IT's You, de Yeosang, San e Wooyoung, que para mim está no Top 3 de canções do álbum. O hip-hop se faz presente aqui em níveis seguros e nada tão exploratório. Entretanto, ainda é uma música sublime e num território mais palpável para mim do que algumas tracks anteriores do CD.
Youth, de Yunho e Mingi, é muito deliciosa de se escutar e uma ótima forma de encaminhar a finalização do disco, e Everything de Jongho é uma ballad impressionante. O solo do integrante do ATEEZ é como um abraço no ouvinte que passou, ao longo de dez faixas, por uma montanha-russa musical espiralada — ela é o ponto de chegada na viagem do barco dos piratas. E para mim, que nem ao menos sabia discernir os membros do ATEEZ até então, a canção foi uma caixa de surpresas para me fazer ir atrás do que mais o Jongho pode me fornecer. Será que ele virou meu bias?
Qual é a próxima parada para o ATEEZ? Não sei, eles são surpreendentes demais
Eu paguei muito a língua com o ATEEZ. THE WORLD EP.FIN: WILL foi o tapa na cara que eu precisava para entender, de uma vez por todas, que o boygroup nunca fará o som que me agrada na zona de conforto: eles me farão ouvir o que eu preciso conhecer. O grupo é dono de uma tenacidade em relação ao seu próprio estilo, moldado desde 2018, que me mostra o quanto preciso sair do senso comum dentro do K-pop — no qual pego deveras preso, apesar de ouvir a música coreana já há quase dez anos.
E o que dizer do fato do ATEEZ ser self-composed? Em outras reviews no Café com Kimchi, deixei claro o quanto amo um grupo que deixa suas impressões digitais na arte que performa, e o comeback dispõe de dez músicas com os integrantes creditados; principalmente Hongjoong e Mingi. Palmas para os rapazes, com toda certeza.
Esses oito artistas perturbam e estrangulam o olhar enviesado que eu possuía sobre eles. THE WORLD EP.FIN: WILL nos leva para camadas profunda do Vale da Estranheza que me fez amar tanto o K-pop — uma indústria que, em altos e baixos, ainda me conquista e me deixa estasiado com videoclipes, coreografias e conceitos que fazem o queixo cair.
É exatamente isso que eu quero nos boygroups: lançamentos que me causem a sensação bizarra de nunca ter escutado algo assim em tempos recentes. Quero grupos masculinos no K-pop que façam caras e bocas, sejam recheados de vitalidade e confiança, e que divulguem comebacks atrevidos, que saiam do que está na moda e mostrem suas verdadeiras identidades. Felizmente, é tudo isso que o ATEEZ me apresentou em doze faixas inéditas.
O ATEEZ é maluco, sem sentido, sexy e fenomenalmente estrondoso, e me faz querer mais, ao ponto de até soltar um grito. E sendo bem sincero, formidável é a palavra para descrever a experiência de mergulhar em grupos para os quais você não dava a mínima.
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