Estrelado por Don Lee, o longa-metragem explora o que vem após o fim do mundo; confira a review abaixo
(Reprodução/Netflix)
O fascínio do público por filmes pós-apocalípticos se justifica por si só: a excitação mórbida pelo desconhecido, o nunca ocorrido, e a genuína curiosidade pelo o que a sociedade se tornará — ou como lidará com situações de extrema escassez em que a riqueza não é estimada pelo dinheiro. A Coreia do Sul adora o tema, já tendo o explorado em grandes produções como o terror “#Alive”, estrelado por Yoo Ah In, e o famosíssimo “Invasão Zumbi”.
No cenário de “Em Ruínas”, novo filme coreano da Netflix, o subgênero de sobrevivência é abordado em uma terra devastada por terremotos e crise hídrica. Nos primeiros minutos, somos inundados de informações muito repentinas sobre o estado atual da humanidade: fome, briga territorial entre grupos, adaptação a novos modelos de existência naquele resto de mundo que ficou para trás.
O que poderia parecer o “normal” de filmes pós-apocalípticos, até então, ganha um tempero quando descobrimos que há pessoas e animais tendo os corpos regenerados quando são feridos. O médico Yang Gi Su, interpretado pelo expressivo Jun Hee Lee, está fazendo experimentos em seres vivos na tentativa de criar um novo mundo em que humanos têm corpos mais fortes e sobrevivem sem água e comida.
Infelizmente, esse pequeno diferencial da história, com potencial de alavancar a trama, desaparece mais rápido que água no deserto. É quase doloroso perceber o filme perdendo o que parecia ser o único propósito sólido, mas, ao longo da jornada, você esquece de se importar o suficiente com o que quer que esteja acontecendo naquele mundo ou com aqueles personagens. Nem o herói Nam San, vivido pelo experiente e carismático Don Lee (que também está no elenco de “Invasão Zumbi”), é necessariamente empolgante.
É esperado que protagonismo e senso de altruísmo nos leve, furtivamente, a torcer pelo mocinho — principalmente se o referido herói for dotado de habilidades de luta e defesa pessoal, com as quais conseguimos aceitar quaisquer soluções bizarras para problemas impossíveis de resolver. Porém, o esforço feito para que o personagem de Don Lee soe despreocupado demais com os perigos que o cercam nos afasta emocionalmente do herói. Se ele doma um jacaré mutante puxando-o pela cauda como se não fosse nada, é divertido de tão absurdo, mas esse mínimo êxtase se desgasta pela descrença que sentimos na existência de uma pessoa tão imbatível como Nam San.
O tímido triunfo do filme está na insanidade do médico Gi Su. Jun Hee Lee dá vida a um vilão muito emotivo e, em alguma instância, fácil de te permitir ser convencido. Por mais que sua presença espirituosa não transmita necessariamente um sentimento de misericórdia, há um magnetismo pela forma como o personagem se expressa, sempre tão obcecado e pouco sutil em suas intenções. Mesmo assim, o efeito se perde porque tudo parece excessivo quando notamos que seu enredo não se sustenta e seus propósitos mirabolantes não parecem guiar a história a lugar nenhum.
A falta de intimidade com os personagens, porém, não diminui a nossa satisfação em testemunhá-los tendo conversas leves e momentos descontraídos que aliviam a tensão do cenário em destruição. A indiferença a respeito do bem-estar deles também se esvai quando as sequências de luta nos provocam apreensão. É nítido que o mocinho vai vencer a batalha corporal, mas a agonia em vê-los gravemente machucados está ali.
"Em Ruínas" é uma história sem pretensões megalomaníacas que vão muito além de entregar um entretenimento inofensivo naquelas quase duas horas, mas que quer tudo o que você, enquanto espectador, possa oferecer — sem dar tanto em troca. Quer ser ficção científica, comédia, romance, terror e ação. Quer suas risadas, suas lágrimas, sua compaixão, sua raiva. Quer, sem construir um terreno sólido para todas essas emoções florescerem com naturalidade.
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