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Opinião | Fanservice no K-pop: Quando o prazer de agradar se torna uma obrigação tóxica

Atualizado: 3 de set.

Embora o fanservice no K-pop seja essencial para fortalecer a relação entre ídolos e fãs, ele também pode levar a comportamentos que beiram o abusivo


Fãs do grupo coreano BTS em um concerto.
(Reprodução/J-Hope via Instagram)

O K-pop é mais do que apenas música; é um fenômeno cultural que conquistou corações globalmente, impulsionado por uma interação intensa entre artistas e seus fãs. Esse vínculo é muitas vezes estabelecido através do "fanservice", que englobam práticas cuidadosamente cultivadas na indústria do entretenimento asiático. No entanto, esse costume, que inicialmente parece inocente e benéfico, pode ter um lado sombrio que contribui para a toxicidade dentro do meio e entre os próprios fãs. Mas o que é o fanservice no K-pop?




O que é fanservice no K-pop?


No contexto do K-pop, o fanservice se refere a gestos, ações e comportamentos de artistas que são feitos especificamente para agradar seus fãs. Isso pode incluir desde interações diretas em redes sociais e durante shows, até atos de carinho e demonstrações de afeto em público. Muitas vezes, essas ações são vistas como uma forma das empresas de entretenimento manterem os fãs engajados e fiéis, garantindo o sucesso contínuo dos grupos e solistas.


Alguns exemplos notáveis de fanservice no K-pop e entre outros artistas asiáticos são:


  • Interações físicas durante performances: Ídolos frequentemente realizam gestos de afeto, como abraços, carinhos no rosto ou segurar as mãos de outros membros do grupo durante shows, criando momentos de proximidade que os fãs adoram.


  • Eventos de fan meetings e Hi-Touch: Em eventos em que ídolos se encontram pessoalmente com os fãs, tiram fotos, conversam e, em alguns casos, participam de sessões de "hi-touch", nas quais os fãs podem tocar nas mãos dos artistas.


  • Mensagens personalizadas em aplicativos pagos: Muitos ídolos utilizam plataformas como Weverse, Lysn ou Bubble para enviar mensagens personalizadas para seus fãs, criando uma sensação de comunicação direta e exclusiva.


  • Participação em programas de variedades: Ídolos frequentemente participam de jogos e desafios divertidos em programas de variedades, nos quais podem mostrar um lado mais leve e engraçado, tudo para entreter os fãs.


  • Atos especiais para fãs em concertos: Durante concertos, não é incomum que os ídolos dediquem músicas específicas aos fãs, leiam cartas emocionantes ou até realizem propostas fictícias de casamento, tudo para criar momentos memoráveis.


  • "Ships" entre membros do grupo: Muitos grupos de K-pop exploram a dinâmica de casais entre membros, na qual dois integrantes agem como se estivessem em um relacionamento romântico, algo que, se bem recebido, é encorajado pelos fãs e pelas próprias agências.


  • Distribuição de presentes pessoais: Alguns ídolos são conhecidos por distribuir presentes pessoais ou lembranças para os fãs, como lanches, cartas escritas à mão ou até itens comprados por eles mesmos, demonstrando carinho e apreço.


Confira abaixo o trailer de um evento de fansign realizado pelo TREASURE em 2023.




Atos de Fanservice: a relação entre fãs e ídolos de K-pop


O poder do fandom no K-pop é inegável. Independente da geração à qual pertencem, grupos como BTS, BLACKPINK, EXO, Red Velvet, BIGBANG, SNSD e Super Junior devem grande parte de seu sucesso duradouro à lealdade de seus fãs. Esses fãs não apenas compram álbuns e produtos, mas também votam incansavelmente em premiações e defendem seus ídolos de qualquer crítica.


A capacidade de um fandom de influenciar a carreira de um artista é tão grande que muitas empresas agora têm departamentos dedicados exclusivamente ao marketing para fãs, com gerentes especializados em manter a conexão entre os artistas e seus seguidores. Empresas de entretenimento estão cientes de que, sem fãs, não há estrelas. Por isso, a interação ativa com o público é uma prioridade.


Além dos tradicionais shows e fan meetings, que são, em sua maioria, eventos presenciais, os artistas frequentemente realizam transmissões ao vivo e oferecem serviços personalizados em aplicativos pagos, mantendo uma comunicação constante com seus seguidores. Dessa forma, eles também conseguem se conectar com fãs internacionais, que formam um público tão fiel e engajado quanto o coreano.


J-Hope, Jimin, V e Jungkook, membros do BTS, em live
(Reprodução/J-Hope via Instagram)



Outras ações, como enviar presentes para os fãs, também são muito populares entre os idols de K-pop. A cantora e atriz IU, por exemplo, é conhecida pela sua constante dedicação aos fãs, seja através de presentes, eventos ou mesmo pequenas gentilezas. Ela é conhecida por comprar lanches para aqueles que a aguardam nas filas de shows e no aeroporto desde o início da carreira, um gesto que se mantém há mais de uma década. Em 2017, IU compartilhou um vídeo em seu canal do YouTube, "IU Official", mostrando as compras dos presentes.


Presentes que IU comprou para os seus fãs em 2017
(Reprodução/ IU via YouTube)

Com isso, o fanservice se torna mais do que uma simples estratégia de marketing: é uma necessidade dentro da indústria do K-pop e além. Ele fortalece a conexão emocional entre fãs e ídolos, garantindo que essa relação continue a prosperar em meio a um cenário musical competitivo e em constante evolução.


Para além do fanservice: A pressão sobre os artistas de K-pop devido a comportamentos possessivos


A expectativa de que os ídolos estejam constantemente à disposição dos fãs pode gerar uma pressão insustentável. A cultura do fanservice cria um ambiente onde os artistas sentem que precisam agradar seus fãs a todo momento, seja em eventos públicos, redes sociais ou até em sua vida pessoal. Nesse cenário, as cobranças vêm tanto das empresas de entretenimento, que desejam maximizar a popularidade dos artistas, quanto dos próprios fãs, que esperam um certo tipo de comportamento e interação.


Esse nível de exigência pode levar ao esgotamento físico e mental dos artistas, que muitas vezes não têm espaço para viver uma vida privada. Dessa forma, os ídolos, muitas vezes jovens e ainda em desenvolvimento emocional, podem se sentir presos em uma posição onde sua identidade e dignidade são sacrificadas em prol de manter a popularidade e a aprovação pública. A ausência de controle sobre suas próprias ações e a obrigação de constantemente agradar podem criar uma sensação de alienação e perda de si mesmo.


Casos como o de V, do BTS, que um tempo atrás foi criticado por não saudar fãs e repórteres no aeroporto, mostram como os ídolos podem ser julgados severamente por ações que, em qualquer outra circunstância, seriam vistas como normais. A exigência para sempre "performar" pode resultar em ansiedade, estresse e outros problemas de saúde mental, como já foi relatado por artistas ao longo dos anos.




Além disso, o fanservice também pode alimentar comportamentos possessivos por parte dos fãs de K-pop. Quando os ídolos demonstram afeto e atenção especial a seus seguidores, alguns fãs podem interpretar essas ações como sinais de um relacionamento mais íntimo e exclusivo, levando a expectativas irrealistas e uma sensação de posse. Isso pode gerar ciúmes, obsessão e até mesmo ações invasivas, como perseguir ídolos ou violar sua privacidade.


A necessidade de atender a todas as demandas dos fãs pode levar os ídolos a situações desconfortáveis ou humilhantes, onde eles se veem forçados a adotar comportamentos ou realizar atividades que não desejam, apenas para manter a aprovação de seu público.


Relações de toxicidade entre fãs


Outro reflexo preocupante do fanservice é a toxicidade que ele pode criar indiretamente dentro dos fandoms de K-pop. O fanservice frequentemente coloca os fãs em uma posição de poder, onde eles sentem que têm o direito de ditar os comportamentos e decisões de seus ídolos. Isso pode levar a uma cultura de cancelamento e ataques online contra os próprios artistas, quando estes falham em corresponder às expectativas impostas.


Os conflitos entre diferentes fandoms também podem ser exacerbados, criando divisões, rivalidades e até campanhas de ódio direcionadas a outros grupos e seus fãs. Assim, a competição por atenção e reconhecimento pode gerar um ambiente tóxico, onde a rivalidade supera a apreciação genuína pela música e pela arte.



As rivalidades entre fandoms no K-pop são uma realidade que frequentemente causa conflitos desnecessários. Por exemplo, quando grupos como BTS e BLACKPINK, ambos com uma base de fãs imensa, alcançam marcos significativos, surgem disputas para determinar qual artista é "superior". Essas rivalidades levam a insultos e ataques, e contribuem para uma visão negativa acerca das comunidades de K-pop nas redes sociais.


Em busca de um equilíbrio duradouro


Enquanto o fanservice é uma parte integral do K-pop e outras indústrias de entretenimento asiáticas, é crucial que haja um equilíbrio. As empresas e artistas precisam estabelecer limites claros para proteger tanto a saúde mental dos ídolos quanto para garantir que o relacionamento com os fãs permaneça saudável e respeitoso.


Muitos artistas já fazem isso. Em 2020, o Baekhyun, solista e membro do EXO, teve seu prédio invadido por duas "fãs" abusivas, as chamadas sasaengs. Elas descobriram seu apartamento e andar e esperavam o retorno do cantor após as suas atividades diárias. Felizmente, ele estava acompanhado de um assessor que escoltou as intrusas para fora do prédio. Depois de expor a situação e revelar como o episódio afetou o seu emocional, ele pediu: "por favor, respeitem a minha privacidade."


Recentemente, o Renjun do NCT também expôs o assédio que sofreu por parte de sasaengs. Em um aplicativo de mensagens — como já vimos, um meio comum de reforçar a conexão entre ídolos e fãs através de fanservice — ele disse "existem muitas maneiras de amar [um artista], mas você não precisa chegar a esse extremo." Na ocasião, ele expôs as pessoas que estavam ligando no seu número pessoal e afirmou que tomaria medidas judiciais. Depois, por determinação da SM Entertainment, ele teve que se desculpar, o que mostra que o debate sobre a falta de limites ainda tem muito a avançar.



Educar os fãs sobre os perigos do comportamento tóxico e promover um ambiente de apoio mútuo são passos essenciais para evitar que o fanservice se torne prejudicial. Afinal, a base de qualquer fandom deve ser o respeito e a compreensão, tanto para com os ídolos quanto entre os próprios fãs. Somente assim, a prática pode continuar sendo uma força positiva na relação entre artistas e seus seguidores, sem cair na armadilha da toxicidade.


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