Os K-dramas que mudam de linha temporal encantam o público ao explorar narrativas envolventes

(Divulgação / SBS)
A Coreia do Sul tem demonstrado um verdadeiro fascínio por produções televisivas que abordam a temática de viagem no tempo. Dos dramas mais recentes, como A Time Called You (2023) e Melancia Cintilante (2023), até sucessos passados como Moon Lovers: Scarlet Heart Ryeo (2016), esses enredos que brincam com a linha temporal têm conquistado uma base de fãs leal e crescente.
A popularidade dessas produções não é acidental. Elas oferecem ao público uma oportunidade de revisitar o passado e imaginar cenários alternativos, sem as dores e os traumas que a história real da Coreia carrega. Em um país que passou por grandes dificuldades, como a ocupação japonesa e a Guerra da Coreia, o sucesso dos K-dramas de época com temas de viagem no tempo pode ser visto como uma maneira de se conectar com um passado idealizado e romantizado, em contraste com os momentos mais sombrios da história coreana.
A tendência e o apelo dos personagens que viajam no tempo
A popularidade dos dramas coreanos com personagens que viajam no tempo vai muito além de uma simples trama fantasiosa: eles oferecem uma mistura única de passado e presente, permitindo aos protagonistas vivenciarem diferentes eras e refletirem sobre seus próprios tempos. Além de Mr. Queen (2020), onde um chef de cozinha acorda no corpo de uma rainha da Dinastia Joseon, o sucesso de produções como Scarlet Heart: Ryeo (2016), Signal (2016) e The King: Eternal Monarch (2020) provam o apelo contínuo deste tipo de narrativa.
Cada um desses dramas oferece diferentes abordagens para o tema, seja o romance trágico em uma corte real, uma investigação policial entre duas linhas do tempo ou a exploração de universos paralelos.
Outro exemplo notável é Tunnel (2017), no qual um detetive viaja 30 anos no futuro para capturar um assassino em série. Essas produções não apenas envolvem o espectador em histórias cativantes, como também permitem contrastar valores antigos com questões modernas, oferecendo uma visão crítica sobre o progresso social e tecnológico. Muitas vezes, os protagonistas nesses dramas buscam corrigir erros do passado ou mudar o curso de suas vidas, como em My Perfect Stranger (2023) e Life on Mars (2018), onde personagens são impulsionados pela necessidade de resolver mistérios ou salvar entes queridos.
Temas universais como vingança, redenção e segundas chances se destacam nessas produções, permitindo uma profunda conexão emocional com o público. Ao revisitar o passado e confrontar suas próprias realidades, os personagens e espectadores se envolvem em jornadas de autodescoberta, tornando o gênero uma das grandes paixões do público coreano e internacional.
A expansão dessa temática no K-drama
As viagens no tempo em K-dramas são uma tendência que não surgiu de repente. Essas obras são uma janela fascinante para a vida cotidiana da Coreia, retratando aspectos culturais e sociais de diferentes períodos, principalmente entre os séculos XIII e XVII. Estas produções frequentemente exploram a vida na Corte Real, histórias de monarcas (alguns fictícios), generais e eunucos, apresentando um rico desfile de vestuários tradicionais, como os hanboks, e elementos da gastronomia, como o kimchi, além da medicina tradicional.
O Palácio Changdeokgung, um dos cinco palácios da dinastia Joseon, serve como cenário para várias dessas narrativas, simbolizando a magnitude da representação cultural que os K-dramas oferecem sobre a história do país.
Um marco importante nesta evolução foi a série Dae Jang Geum (Uma Joia no Palácio), que se destacou como a primeira novela histórica da Hallyu. A trama, que segue a trajetória de uma menina órfã que se torna a primeira mulher médica do rei, foi exibida entre 2003 e 2004 e teve uma recepção massiva, sendo exportada para 91 países, com um impacto econômico significativo estimado em mais de 112 bilhões de wones.
Essa influência cultural é relevante para a UNESCO, que define o patrimônio cultural como um reflexo da criatividade e da identidade de um povo, englobando suas tradições e expressões artísticas. A presença atual de redes sociais e plataformas digitais também tem ampliado o acesso e a apreciação desses legados, permitindo que novas gerações se conectem e se identifiquem com a rica herança da Coreia.
Atualmente, o Patrimônio Cultural se transformou em um ativo comercial atraente para consumidores e viajantes que buscam experiências ligadas ao turismo local e sustentável.
Os K-dramas, especialmente os históricos, desempenham um papel crucial na projeção da imagem da Coreia do Sul como um destino turístico de prestígio. Assim, os turistas buscam conhecer novas culturas e imergir em tradições locais, o que se torna mais fácil quando um país, como a Coreia, constrói uma marca forte em torno de sua identidade cultural, ajudada por sua robusta indústria de entretenimento.
No entanto, essa fusão de história e ficção não está isenta de críticas. Por exemplo, a série Joseon Exorcist, lançada em 2021, enfrentou um boicote significativo devido à inclusão de elementos culturais chineses que distorceram representações coreanas, destacando a importância da autenticidade nas narrativas históricas.
Leia também: Vai viajar? Confira os melhores lugares para K-poppers e dorameiros visitarem na Coreia do Sul
A viagem no tempo no contexto ocidental e coreano
No Ocidente, a viagem no tempo também tem sido uma temática amplamente explorada, mas geralmente com um enfoque diferente. Filmes como De Volta para o Futuro (1985) e séries como Doctor Who (2005) tendem a tratar o tema de forma mais científica ou fantástica, muitas vezes explorando os paradoxos temporais e as consequências de alterar o passado.
No entanto, tanto no Ocidente quanto na Coreia, um elemento comum é a ideia de que pequenas mudanças no passado podem ter grandes repercussões no futuro — um conceito explorado em filmes como Efeito Borboleta (2004) e em K-dramas como Signal (2016), onde os personagens tentam prevenir crimes utilizando a viagem no tempo.
Essas produções, independentemente de sua origem, compartilham a capacidade de conectar o público emocionalmente com a ideia de segundas chances, a nostalgia por tempos passados, e a reflexão sobre o impacto das ações humanas ao longo da história
Em muitos K-dramas, a possibilidade de voltar ao passado não apenas serve como um mecanismo de enredo, mas também funciona como uma forma de os personagens lidarem com suas próprias falhas e experiências traumáticas. Por exemplo, em Goblin (2016), a narrativa se desdobra em um pano de fundo histórico, onde as ações dos personagens têm consequências significativas para suas vidas e as de seus entes queridos.
Esse uso da viagem no tempo permite que tanto os espectadores ocidentais quanto os coreanos reflitam sobre como o passado molda o presente e as implicações que suas escolhas atuais podem ter para o futuro, intensificando o apelo emocional e a ressonância cultural dessas histórias.
A nostalgia e o conforto das narrativas históricas
Além disso, uma possível explicação para o sucesso desses dramas no cenário coreano atual está no desejo coletivo de explorar o passado sem reviver suas dores. O público coreano, que convive com uma história recente marcada por conflitos e traumas, pode encontrar consolo nessas narrativas. O gênero oferece uma versão do passado onde personagens têm o poder de mudar o curso da história — uma fantasia reconfortante, considerando que muitos aspectos da história coreana estiveram fora do controle de seu povo por muito tempo.
A história da Coreia do Sul é rica e multifacetada, começando com a unificação de três reinos: Silla, Goguryo e Baekje, que contribuíram para a formação da identidade coreana. Após séculos de desenvolvimento, a Coreia enfrentou a ocupação japonesa de 1910 a 1945, um período marcado pela exploração econômica e pela opressão cultural. A derrota do Japão na Segunda Guerra Mundial levou à divisão da península, resultando na criação da Coreia do Sul, alinhada com os Estados Unidos, e da Coreia do Norte, apoiada pela União Soviética.
A Guerra da Coreia (1950-1953) foi um marco traumático, deixando cicatrizes profundas que ainda refletem nas relações entre os dois países. Entretanto, a Coreia do Sul conseguiu se reinventar, transformando-se em uma economia dinâmica e classificada como um dos "Tigres Asiáticos". Hoje, é uma democracia industrializada com uma das mais altas taxas de desenvolvimento humano do mundo, e seu impacto cultural se estende globalmente através de produções de K-dramas e K-pop.
Entre os muitos gêneros dos K-dramas, as produções históricas e as que envolvem viagens no tempo se destacam por sua capacidade de mesclar a rica história sul-coreana com elementos de fantasia. Títulos como Goblin e Moon Lovers: Scarlet Heart Ryeo transportam os espectadores para épocas passadas, misturando eventos históricos com narrativas de amor e aventuras. Esses dramas não apenas oferecem entretenimento, mas também proporcionam uma nova perspectiva sobre a história da Coreia, permitindo que o público explore a cultura e as tradições do país de forma envolvente.
Por meio dessas produções, a Coreia do Sul também busca, enquanto moderniza sua economia e sociedade, valorizar e reinterpretar sua rica herança cultural. K-dramas como Tale of the Nine Tailed 1938 (2023) e Life on Mars (2018) mostram personagens que visitam épocas de grande importância histórica, como os anos 1930 ou 1980, mas que usam suas habilidades e conhecimento moderno para influenciar o que está ao seu redor. Isso talvez reflita o desejo coletivo de revisitar a história com os olhos de hoje, onde traumas do passado podem ser reparados ou, pelo menos, melhor compreendidos.
O futuro da viagem no tempo nos K-dramas
Com o sucesso contínuo desses dramas, o futuro parece promissor para a temática de viagem no tempo. E, embora muitos possam argumentar que essa tendência pode se desgastar, os roteiristas coreanos continuam a encontrar novas maneiras de reinventar o conceito. Cada nova produção oferece uma perspectiva única, seja através de personagens cativantes, narrativas emocionantes ou retratos ricos de períodos históricos que ainda fascinam o público.
Em resumo, os K-dramas de viagem no tempo não apenas oferecem entretenimento, mas também uma espécie de catarse coletiva, onde personagens e espectadores têm a oportunidade de navegar entre o presente e o passado, explorando suas possibilidades e reescrevendo histórias.
Qual é o seu K-drama de viagem no tempo favorito? Compartilhe com a gente nos comentários e envie a matéria para aquele amigo que ama essas histórias cheias de reviravoltas e nostalgia!
Comments